Publicado 12
de julho de 2014 - Terceirização e
trabalho análogo ao escravo: coincidência?.

Estamos na iminência de possível inflexão da regulação da
terceirização e do trabalho análogo ao escravo. Quanto a este último, foi
promulgada este mês emenda à Constituição que prevê a expropriação de
propriedade na qual for flagrada exploração de trabalhadores nessas condições.
Contudo, empregadores e suas entidades representativas estão tentando
aproveitar a regulamentação dessa emenda para alterar o conceito de trabalho
análogo ao escravo.
Sua intenção é restringir o crime à coerção individual direta e
absolver todas as formas de opressão típicas da coerção do mercado de trabalho,
que são aquelas próprias do capitalismo. Assim, se reduziriam drasticamente os
limites à exploração do trabalho.
Terceirização no STF
Quanto à terceirização, o Supremo Tribunal Federal decidiu reconhecer
repercussão geral à decisão que será tomada em processo sobre o tema, que
servirá como precedente fortíssimo à atuação de todo o Judiciário, demais
instituições de regulação do trabalho e, em especial, às empresas. O ministro
Luiz Fux deu provimento ao recurso patronal de embargos declaratórios em
recurso extraordinário com agravo regimental em 2013 (baixe a decisão em PDF),
no que foi integralmente acompanhado pelos demais componentes da Turma, para
reconhecer repercussão geral ao tema da terceirização de atividade-fim, em 1º
de abril de 2014 (baixe a decisão em
PDF). Acompanhe os desdobramentos da ARE 713211 MG direto no site do STF.
As empresas que terceirizam buscam, dentre outros objetivos,
externalizar custos e diversos riscos (dos adoecimentos laborais ao próprio
sucesso do negócio). Além disso, tentam transferir (afastar) a incidência da
regulação exógena (Estado e sindicatos) do seu processo de acumulação,
externalizando ao ente interposto o encargo de ser objeto de qualquer regulação
limitadora.
A adoção da terceirização pelas empresas potencializa a capacidade de
exploração do trabalho e reduz a probabilidade de atuação dos agentes que
poderiam impor limites a esse processo. É exatamente nessa combinação de
fatores que reside a relação entre terceirização e trabalho análogo ao escravo.
Supremacia empresarial
Ao incrementar a supremacia empresarial sobre o trabalhador, e
diminuir as chances de atuação de forças que limitam esse desequilíbrio, a
gestão do trabalho por meio da terceirização engendra tendência muito maior a
ultrapassar as condições de exploração consideradas como limites à relação de
emprego no quadro jurídico brasileiro.
Dos dez maiores resgates de trabalhadores em condições análogas à de
escravos no Brasil em cada um dos últimos quatro anos (2010 a 2013), em 90% dos
flagrantes os trabalhadores vitimados eram terceirizados
Assim, a terceirização tende a promover o trabalho análogo ao escravo
mais do que uma gestão do trabalho estabelecida sem a figura de ente
interposto, se vinculando às piores condições de trabalho apuradas em todo o
país.
Dos 10 maiores resgates de trabalhadores em condições análogas à de
escravos no Brasil em cada um dos últimos quatro anos (2010 a 2013), em 90% dos
flagrantes os trabalhadores vitimados eram terceirizados, conforme dados
obtidos a partir do total de ações do Departamento de Erradicação do Trabalho
Escravo (Detrae) do Ministério do Trabalho e Emprego.
Note-se que esses dados não discriminam setor da economia, porte das
empresas, ou regiões do país. Poder-se-ia alegar que seriam terceirizações
espúrias, constituídas por empresas informais, ou pessoas físicas, como
“gatos”. Ou seja, não estaríamos tratando da “verdadeira” terceirização, mas
apenas da “má”.
Trabalho escravo
Para
analisar a procedência dessa eventual alegação, vejamos os dados concernentes
aos resgates nos quais os trabalhadores eram formalizados, casos típicos da
presumida “verdadeira” terceirização. Entre os resgates ocorridos em 2013, nos
oito maiores casos em que a totalidade dos trabalhadores eram formais, todos
eles eram terceirizados formalizados por figuras interpostas. Já no grupo de
resgates com parte dos trabalhadores com vínculo formalizado, das dez maiores
ações, em nove os trabalhadores resgatados eram terceirizados.
Fonte: Repórter Brasil/DMT
Acesso em 15/08/2014 20:46
Nenhum comentário:
Postar um comentário